
ESPECIALISTA EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS ALERTA
…O DESENVOLVIMENTO QUE O PAÍS DE KAGAME TEM, NÃO É FRUTO DA BOA GOVERNAÇÃO…
- por Redacção --
- Friday, 21 Mar, 2025
O especialista em Relações Internacionais, garantiu que a diversidade de recursos minerais raros existente na RDC, tem sido um dos principais factores do conflito e revela que o desenvolvimento que o Ruanda tem, não é fruto da boa governação, ou do seu Produto Interno Bruto (PIB).
A guerra na República Democrática do Congo, tem estado a dividir opiniões relativamente as causas e soluções. Em mais um exercício semanal, no sentido de levarmos aos internautas, o que está por trás da guerra neste país vizinho de Angola, entrevistamos o especialista em Relações Internacionais, Agostinho Cassoma.
Inicialmente, garantiu ser preocupante o que se vive neste território, pois pelo seu posicionamento geográfico, pode arrastar outros Estados para esta guerra, que afecta principalmente o leste do país.
Questionado sobre a origem do conflito, esclareceu que tem múltiplas razões, tendo olhado para o genocídio de 1994 no Ruanda, entre Tutsis e Utus, como um dos pontos de partida. Naquela altura, explicou que os Tutsis perderam a batalha e foram refugiar-se no Congo Democrático.
O especialista descorda dos políticos que defendem que os grandes conflitos em África são geralmente por razões étnicas.
‘‘Eu defendo o contrário, pois, o grande problema do Congo é apenas pelo azar de ser dos poucos países no mundo que possui recursos minerais como coltan, cobalto, diamante, petróleo e outros, e parte destes minérios são considerados raros, e justamente aqueles que a indústria tecnológica precisa para o seu desenvolvimento,” avançou.
O especialista afirma que o Congo por possuir esses minerais, o ocidente tem financiado o Ruanda, que por sua vez suporta o M23, para criar uma instabilidade permanente no Congo Democrático, para o seu benefício.
Quando questionado sobre o início do conflito, Agostinho Cassoma, disse que o ‘‘Congo nasceu em um estado de conflito’’, declarando que a RDC tem a sua independência desde 30 de junho de 1960, e que do ponto de vista político, apenas do presidente Kabila filho para Tshisekedi é que não houve golpe de estado.
O especialista defende que o ‘‘Ruanda é um cavalo de troia do ocidente,’’ tendo esclarecido que o cavalo de troia está associado a mitologia grega. Recorda, quando os gregos ofereceram um cavalo de madeira a cidade de Troia, dentro estavam soldados para abrir o conflito naquele território e assim o fizeram.
Para se ter indústrias tecnológicas, no mundo a funcionar é necessário que se exporte coltan, cobalto e outros recursos, para tal, o especialista em Relações Internacionais, sublinhou que a nível internacional, quem tem estes recursos em maior reserva é o Congo, por isso, conclui ser um factor que tem causado a instabilidade permanente, por interessar as grandes indústrias tecnológicas.
“Por exemplo, se eu tiver de comprar uma porção de ouro a 100 dólares que é o preço oficial, e for ao mercado negro e encontrar a 30 ou 25 dólares, é claro que vou preferir comprar no mercado negro porque terei mais rendimento. O que quer dizer que o Congo neste momento é o mercado negro, por isso a continuidade do conflito, e não por razões étnicas. O que se quer é que não haja a paz na RDC,” acrescentou.
O especialista, lamentou o facto do grupo armado M23, está a tomar aos poucos “todo” o Leste da RDC, com ameaças em chegar até a capital (Kinshasa). Caso aconteça, perspectiva que o conflito durará mais tempo do que se imagine para o seu o fim e apelou Angola a estar em alerta.
Ao longo da entrevista, recordou uma frase muito usada em Relações Internacionais, que ‘‘a guerra se prepara em tempos de paz, e a paz se prepara em tempos de guerra,’’ para esclarecer que existe países africanos, que no momento de tranquilidade lamentavelmente deixam de investir nos órgãos de defesa e segurança, porque entendem que pelo facto de não haver guerra não há necessidade de adquirir meios bélicos.
O também professor, avançou que perante esta falta de preparação e investimento, faz com que alguns países no continente, quando surge uma situação de instabilidade, são pegos de surpresa, como aconteceu com a RDC.
Na perpectiva do especialista, o Congo corre o risco de tornar-se um Estado falhado, por não conseguir defender o seu território, o seu povo, a sua soberania e não ter capacidade militar e tecnológica para fazer frente aos desafios actuais.
Intervenção internacional
Agostinho Cassoma disse que tem havido a intervenção externa para pôr fim ao conflito. Defende por sua vez, que mais do que uma intervenção internacional, o governo congolês precisa de força, de intervenção militar, pois o seu exército presumivelmente é frágil.
‘‘As organizações internacionais não têm capacidade de fazer a guerra, para que ela possa intervir neste conflito, tem de mobilizar recursos, homens, e esses são mobilizados nos Estados, se o interesse for apaziguar o Congo, os países mais próximos a intervir têm de ser o próprio Ruanda, Uganda, Angola, mas esses só darão os seus recursos para tranquilizar, caso não tenham interesses em tirar dividendos do conflito, ’’afirmou.
O nosso entrevistado declarou que, se o conflito continuar haverá uma instabilidade permanente, pois a muito que a paz no Congo está ameaçada, e isso, requer uma diplomacia directa, o que significa pôr a mesa os chefes de Estados que estão a volta da RDC e convidar as milícias envolvidas.
Agostinho Cassoma felicitou Angola pela estratégia que tem optado em levar a cabo uma diplomacia directa, organizando cimeiras, para que se chegue a um entendimento entre as partes em conflito.
‘‘Do ponto de vista da diplomacia, o presidente angolano tem feito um trabalho visível, mas sempre que se chega próximo de um entendimento uma das partes se afasta do acordo,” descreveu.
Quanto a não comparência do M23, no encontro convocado por Angola, que contaria com participação da delegação do governo congolês, há 18 de março, em Luanda, adiantou que os mesmos não compareceram por supostamente não terem sido convidados de forma oficial, por tomarem conhecimento por via das redes sociais, por isso chamou a atenção ao Ministério das Relações Exteriores, que devia emitir um comunicado a esclarecer os canais usados para o convite e quem representaria o grupo em Angola.
‘‘Não há diplomacia directa, visto que das vezes que Angola convidou Poul Kagame para as várias cimeiras, o presidente do Ruanda recuava, alegando que não concordava com vários elementos do acordo. Creio eu que ele se retirou, porque não há interesse em chegar a uma paz definitiva no Congo, pois tira benefícios de alguns Estados,’’ disse ao Ponto de Situação.
O convidado, declarou que a paz definitiva, obrigaria a desmilitarização, o aquartelamento, a desmobilização e em alguns casos a integração de alguns elementos das milícias no exército regular do Congo, outrossim, teriam de voltar para “o seu país de origem, o que deixa Kagame preocupado, pois pode se dar o caso que estando em seu território, algum dia os mesmos criem instabilidade, logo, para ele, é melhor que permaneçam na RDC.”
Agostinho Cassoma, deplorou a situação da RDC, por nunca ter tido uma paz efectiva desde a sua independência e relações frágeis com os Estados vizinhos.
‘‘Não basta que haja vontade para acudir esta situação, é preciso que se transforme a vontade em acções concretas, “sublinhou.
Desvantagens da RDC
O especialista entendido na matéria, explicou que geograficamente, a República Democrática do Congo, não tem um posicionamento para o mar, o que quer dizer que é um país encravado, e desta forma para escoar o seu recurso tem de passar por outros Estados ou teria de transportá-los via aérea. A seu ver, quando um país tem posicionamento para o mar, é importante do ponto de vista estratégico, porque a soberania defende-se por terra, mar e ar.
Ainda sobre a questão do Ruanda, acusou este país, de ter intenções de continuar a explorar os minerais na RDC, como forma de se sustentar e reforça que este país, tem a agricultura como um dos seus recursos, todavia acredita que o seu ‘‘desenvolvimento económico está ligado ao conflito no Congo.’’
Entendimento entre as partes não será para breve
‘‘Para ser realista, no ponto de vista prático não se avizinha um entendimento nos próximos dias, será muito difícil,” apontou.
Nesta altura, sugeriu que deve prevalecer o bom censo, a diplomacia, mas sobretudo o interesse dos líderes e questiona o papel actualmente da União Africana.
‘‘O caso do Congo não tem apenas a ver com os líderes congoleses. Para estabilidade neste país é preciso dialogar com quem lidera de facto essas milícias, é preciso ouvir os insatisfeitos, até mesmo no seio da população, porque o que provoca rebelião muitas vezes são as condições económicas e sociais. Portanto é necessário que se dialogue com essas pessoas e se discuta uma paz a longo prazo,” considerou como uma das soluções que antevê diante deste imbróglio.
‘‘Nas análises que faço, não haverá paz na RDC nem no final de 2025, enquanto os Estados não se abrirem e fazerem um encontro inclusivo com todos os envolvidos a mesa, enquanto o ocidente que precisa das matérias primas do Congo para alavancar as suas indústrias não forem chamados, não se avizinha uma paz,’’ declarou.
Agostinho Cassoma aconselhou que além da diplomacia e da boa vontade é necessário partir para as acções concretas, isto é, colocar à mesa os nove países que fazem fronteira com o Congo, saber as milícias que actuam no Leste do território e o que elas reclamam, porque a etnia Tútsi existe no Uganda, Ruanda e na RDC.
Prosseguiu, ser necessário que todos sejam chamados a mesa das negociações, os que se identificarem com os congoleses e quiserem permanecer no Congo, devem ser reintegrados na vida activa, social e política; aqueles que quiserem residir no Ruanda, devem ser acolhidos de formas a serem reintegrados.
Ao longo da entrevista, o especialista em Relações Internacionais, disse que a população é sempre o lado mais fraco, ‘‘faz-se a guerra para defender o povo, em nome do povo, mas são eles que morrem, povo é sempre vítima do sistema.’’
O entrevistado aconselhou aos Estados africanos a gerir com racionalidade os recursos, e não apenas viverem no conforto e na mordomia e em contrapartida fazer sofrer a população.
‘‘Com a capacidade de recursos que o Congo tem, se tivéssemos que fazer uma gestão racional, destes bens, a RDC seria um povo feliz,” finalizou.
Leia também PROFESSOR ESCLARECE CAUSAS DO CONFLITO NA RDC
Redacção Ponto de Situação