AS PRISÕES DO ÓDIO E AS CHAVES DO AMOR
Tenho assistido a muitos filmes do quotidiano, maioritariamente os que não passam no grande ecrã, mas os que se projectam todos os dias diante dos nossos olhos.
Neles, cidadãos comuns são julgados e condenados no tribunal invisível da vida, vítimas de um sentimento destruidor que se aloja no coração de muitos: o ódio.
Os meus olhos viram, os meus ouvidos ouviram e as minhas mãos folhearam histórias manchadas de falsidade, escritas apenas com o intuito de ver o próximo encarcerado na prisão da injustiça. São relatos de pessoas que perderam o norte do amor e preferiram a escalada sem escrúpulos até ao cume da montanha, ainda que para isso lançassem presentes envenenados, erguessem emboscadas e atirassem pedras à frágil andorinha em pleno voo.
Recordo-me de um filme que vi recentemente, mais do que cinema, parecia parábola. Um pugilista, herói do povo, vencia combate após combate, mas o triunfo repetido despertou o ciúme e o ódio de muitos. Criaram uma teia de mentiras, falsificaram provas, e ele foi condenado à prisão, onde permaneceu quase três décadas. O tempo era um carrasco que lhe roubava a esperança, até que o amor falou mais alto. Amigos não desistiram, procuraram, lutaram, reconstruíram a verdade e a inocência, finalmente provada, devolveu-lhe a liberdade, tarde, mas valeu apena.
Este episódio, embora cinematográfico, é reflexo do que a vida repete à nossa volta. Quantos não caem diariamente em armadilhas cuidadosamente armadas por rostos conhecidos e outros escondidos, apenas porque a luz que carregam incomoda?
Tem pessoas que vivem em celas emocionais, não de betão, mas erguidas pelo rancor alheio.
Quantos não são aprisionados diariamente por emboscadas silenciosas? Muitas vezes, o inimigo tem rosto familiar, às vezes é o vizinho, o colega, o amigo de infância. Outras vezes, é apenas a sombra dos que não suportam a luz que carregamos.
A sabedoria dos mais velhos não falha: “O rio não bebe a sua própria água, a árvore não come os seus próprios frutos, e o sol não guarda para si a sua própria luz.”
O amor é isso: partilha; consiste em alegrarmo-nos com a vitória do próximo que o nosso próprio caminho se ilumina.
O ódio aprisiona. O amor liberta. É dele que precisamos para reconstruir o tecido rasgado da sociedade. O amor é força germinadora, deve brotar no íntimo, como semente que não se deixa sufocar pelo joio da inveja. É no gesto simples de se alegrar com a vitória do próximo que reside a chave para uma comunidade mais justa e humana.
Sejamos, pois, uma sociedade nova, capaz de resgatar o amor e banir o ódio. Só assim conseguiremos transformar a prisão em horizonte, a solidão em comunhão, e a queda da andorinha num voo colectivo em direcção à esperança.
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