CULTURA DO ‘ISSO NÃO É PARA ELAS’ CONTINUA A AFASTAR MULHERES DO RELVADO
A discriminação e o fraco incentivo são apontados como factores que contribuem para a reduzida adesão das mulheres à prática do futebol em Angola.

Dadilson, entrevistado pelo Ponto de Situação, admite não acompanhar os campeonatos femininos, mas considera que “a nossa cultura não valoriza este tipo de desporto”. Conta ainda que conhece duas amigas que chegaram a treinar futebol, ainda que fora de clubes conceituados, mas acabaram por desistir por não vislumbrarem futuro na modalidade.
Adriano, outro cidadão ouvido, defende que "o futebol, tal como o andebol, deviam ser apenas desportos para homens", argumentando que as mulheres, ao praticarem futebol durante longos períodos, acabam por desenvolver características físicas mais associadas ao sexo masculino. Esta visão, ainda dominante em certos sectores da sociedade, reflecte entraves culturais profundos.
Numa posição contrária, José Hebo alerta que o futebol deve ser desenvolvido por quem tem paixão, independentemente do género e reprova quem insiste em classificá-lo como desporto masculino.
A fonte aponta a falta de interesse por parte da Federação Angolana de Futebol e dos promotores de campeonatos locais como um dos principais obstáculos.
“O futebol feminino devia ser mais divulgado, para atrair não só mais mulheres, mas também homens no papel de apoiantes”, sublinha.
Baptista João, residente no município de Belas, reforça que a fraca adesão se deve à ausência de incentivo e à escassez de infra-estruturas desportivas nos bairros. Apela ao Ministério da Juventude e Desportos, à FAF e aos clubes para que invistam de forma consistente no futebol feminino.
Baptista João considera ainda que as próprias mulheres devem encorajar-se mutuamente, tal como acontece noutras áreas onde buscam protagonismo.
José Hebo acredita que, se fosse adoptada a dinámica do andebol, onde os campeonatos são competitivos e a selecção é respeitada internacionalmente, o cenário seria outro.
Ernestina, a única mulher a aceitar dar o seu testemunho nesta reportagem, reconhece que nunca praticou futebol e que também não acompanha a modalidade com regularidade.
“É comum vermos campeonatos masculinos, mas para as mulheres nunca vi. Acho que elas também não se mostram muito interessadas; estão mais ocupadas com os afazeres de casa”, afirma, reflectindo uma percepção social ainda muito enraizada.
Avelino Germano partilha da ideia de que a fraca adesão feminina ao futebol se deve, por um lado, ao reduzido investimento e, por outro, a questões culturais. Na sua opinião, em Angola, as mulheres são educadas sobretudo para se dedicarem às tarefas domésticas.
Grande parte dos entrevistados admite já ter ouvido falar de futebol feminino, mas alega nunca ter assistido a campeonatos da modalidade.
Referem que há poucas equipas no país, o que fragiliza o sector, e sugerem que a FAF e o Ministério da Juventude e Desportos devem aproveitar a estrutura de clubes como o Petro de Luanda e o 1º de Agosto para dinamizar a prática do futebol feminino desde a infância, à semelhança do que acontece na Europa e nas Américas, onde o desporto tem alcançado maior maturidade.