COMO FICAR SOZINHO PODE TORNAR-NOS MAIS FELIZES
No recente filme Dias Perfeitos, do realizador Wim Wenders, o protagonista, um limpador de casas de banho em Tóquio, passa os seus dias em silêncio, a regar plantas, ouvir música, ler e contemplar a vida. Sozinho. Para muitos espectadores, aqueles primeiros minutos do filme são, paradoxalmente, perfeitos.

Descrito pelo crítico da BBC, Nicholas Barber, como "uma meditação em forma de documentário sobre a serenidade de uma existência reduzida ao essencial", o filme despertou interesse num tema cada vez mais visível nas prateleiras, nos ecrãs e nos auscultadores: a solidão, voluntária, calma e criativa.
"Pergunte a você mesmo o que você mais gosta em ficar sozinho", aconselha ela. "Transforme o momento que você escolher em uma joia e atribua a você mesmo a tarefa de valorizar este espaço específico cada vez mais."
E o mais importante e óbvio é misturar um pouco de cada coisa.
"Os seres humanos realmente precisam de interações sociais, mas eu também diria que eles precisam de solidão", segundo Robert Coplan.
"Encontrar o equilíbrio certo é a chave para a felicidade e o bem-estar. Existe um equilíbrio diferente que irá funcionar para cada pessoa."
Nos últimos dois anos, foram lançados vários livros que exploram o poder de estar só. Obras como Solitude: The Science and Power of Being Alone e Solo: Building a Remarkable Life of Your Own (ambos de 2024), defendem que a solidão, longe de ser algo negativo, pode ser um caminho de reencontro pessoal.
A jornalista britânica Nicola Slawson, no seu livro Single: Living a Complete Life on Your Own Terms, propõe que a vida de uma pessoa solteira não é uma sala de espera para a felicidade, mas um palco onde se pode viver em pleno. Já Emma Gannon, no romance Table for One, narra a história de uma jovem que encontra alegria e liberdade no estar só sem parceiro, sem culpa, sem pressa.
Outros títulos que chegarão ainda este ano, como The Joy of Solitude e The Joy of Sleeping Alone, apontam na mesma direcção: há prazer, paz e até poder na companhia de nós próprios.
Como ficar bem sozinho?
Se estar só é cada vez mais comum e menos estigmatizado, como tirar o melhor proveito desse estado?
Especialistas apontam dois factores essenciais: a capacidade de escolha e o equilíbrio com o mundo exterior. A solidão forçada é dolorosa; a escolhida, libertadora.
Heather Hansen afirma que "a maior indicação de sucesso no tempo a sós é quando a pessoa escolhe esse espaço, reconhecendo nele valor e significado". E descreve a solidão como "uma bolha neutra de argila que pode ser moldada ao nosso gosto".
Peter McGraw, por sua vez, adverte que “estar sozinho não deve ser sinónimo de isolamento passivo ficar deitado, a pedir comida e a fumar vapes”. Em vez disso, recomenda actividades que florescem na solitude: passeios, visitas a museus, cursos online, escrever, ouvir música, ou simplesmente observar o mundo numa esplanada.
Nicola Slawson reforça: "não espere por um parceiro para viver experiências. Viva agora, com o que tem."
Uma experiência sensorial e criativa
Emma Gannon vê a solidão como uma aventura sensorial. "A solidão estimula a criatividade e obriga-nos a resolver problemas de forma mais intuitiva", explica. Sugere prestar atenção ao corpo e aos sentidos: "o cobertor macio, o sabor dos alimentos, o som da música. O que vês, tocas, cheiras ou sentes quando estás sozinho?"
A terapeuta Cynthia Zak, por seu lado, propõe que criemos pequenos rituais de solidão como manter um diário ou praticar momentos de silêncio que ajudem a transformar esse tempo em fonte de calma e reflexão.
No fundo, ficar sozinho pode não ser uma ausência mas uma presença mais profunda. A nossa.