NA RUA POR UM FUTURO: O OFÍCIO INVISÍVEL DAS MULHERES AMBULANTES

Senhoras dedicadas à venda ambulante, na Vila do Gamek, em Luanda, relatam trabalhar arduamente para custear os estudos e contribuir para o sustento familiar.

NA RUA POR UM FUTURO: O OFÍCIO INVISÍVEL DAS MULHERES AMBULANTES

Ao longo da reportagem, observámos mulheres de várias faixas etárias a exercer a actividade comercial naquela zona da capital. Uma das vendedeiras, que aceitou falar ao Ponto de Situação, confessou que o caminho tem sido tudo menos fácil.

As entrevistadas garantem que se dedicam à venda ambulante por falta de alternativas. Procuram, com esforço diário, levar sustento aos filhos e apoiar os companheiros nesta luta que consideram de sobrevivência.

Vender nas ruas, sob chuva ou sol abrasador, enfrentando poeira, fome, sede e outras dificuldades, é, segundo dizem, a melhor opção face a ocupações que não dignificariam as suas vidas nem a das suas famílias.

Identificada apenas como Lú, uma das cidadãs vende sambapito há mais de cinco anos. Durante a conversa, revelou que, com o pouco que arrecada, consegue garantir a formação dos filhos, ainda que a luta seja dura e, como frisou, "poucos têm noção disso".

Marcelina Manuel, há cerca de três meses no ofício, vende bolinhos e água fresca em embalagens. Os seus principais clientes são taxistas, cobradores, “chamadores de táxi”, passageiros, colegas e outros populares. Admitiu ser difícil sustentar os filhos com o que ganha, mas afirma que não pode parar e promete continuar a sacrificar-se por uma vida melhor.

Com três filhos a estudar, o que aufere permite-lhe apoiar o companheiro na manutenção do lar. Garante que o período das 10h00 às 12h00 é o mais lucrativo, sobretudo na venda de água fresca (duas embalagens por 50 kwanzas). Contudo, reconhece que, com o frio, há menos consumo e, por isso, o negócio torna-se menos rentável.

A senhora Maria António, camponesa vinda do Cuanza Sul, encontra-se de passagem por Luanda, onde reside com a filha. Por estar habituada ao labor agrícola, diz não conseguir permanecer em casa e, por isso, optou temporariamente por comercializar.

 Quando questionada sobre os lucros, respondeu entre risos que, por dia, mal arrecada 5 mil kwanzas, devido à escassez de clientes na venda de bombó com ginguba. Ainda assim, acredita que com persistência vencerá.

Ilda Samuel, residente no Projecto Nova Vida, vende ginguba há um ano e meio. Estudante do 1.º ano do curso de Psicologia, numa instituição privada do ensino superior em Luanda, paga mensalmente 24 mil kwanzas. A sua luta é manter a independência financeira. Com o que ganha, consegue amealhar o suficiente para garantir a continuidade da sua formação.

A futura psicóloga aproveitou para aconselhar outras mulheres a não sentirem vergonha de vender, sublinhando que se trata de uma forma honesta de ganhar a vida.

Com 70 anos, proveniente do Cuanza Sul, Madalena José vive há vários anos em Luanda. Já vendeu frutas no bairro do Prenda e actualmente cuida da mãe, de 91 anos, no município do Kilamba Kiaxi. Apesar do apoio dos filhos, continua a vender kizaca, proveniente da sua própria lavra.

Começou a vender com apenas 16 anos e afirma que, por dia, arrecada entre 1500 e 2500 kwanzas. O negócio tem tido algum lucro, uma vez que não depende de terceiros para a matéria-prima.

Dona Madalena apela às demais mulheres para que trabalhem e não dependam exclusivamente dos maridos. "Se os dois labutarem, a vida melhora e deixam de ser chamadas de preguiçosas", rematou.

Victória Hebo, viúva, vende cana em várias paragens da Vila do Gamek. Iniciou no comércio após a morte do esposo. Apesar de o negócio não render o que ambicionava, afirma lutar para que o fogão em casa "não se apague" e os filhos tenham algo para comer. Contudo, confessa não conseguir custear a formação dos filhos e por isso procura outras fontes de rendimento.

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